domingo, 23 de fevereiro de 2014

12 Anos de Escravidão


* A escravidão é uma das vergonhas que teremos que carregar pelo resto da nossa História. De bom, não nos trouxe nada – a não ser pelas obras de arte. Não há como não se comover com O Navio Negreiro, de Castro Alves: “se o velho arqueja, se no chão resvala, ouvem-se gritos, o chicote estala e voam mais e mais...”

* Igualmente doloroso é o filme 12 Anos de Escravidão, do diretor inglês Steve McQueen. Eu fico imaginando a sensação de redenção que deve ser para um cineasta negro poder mostrar no cinema uma cena de açoite sem filtros. Não alivia as feridas herdadas dos seus ancestrais, mas se compartilha.

* Trata-se da real história de Solomon Northup, um negro nascido livre que mora com sua esposa e filhos em Saratoga quando, em uma certa noite, é sequestrado e vendido como mercadoria, sendo obrigado a trabalhar como escravo durante doze anos.

* Num primeiro momento, Chiwetel Ejiofor recusou a oferta de McQueen pra encarnar o personagem de Solomon, mas depois aceitou o desafio de viver o grande papel de sua vida. Para tanto, o ator mergulhou numa plantação de algodão na Louisiana e aprendeu a tocar violino.

* Depois de Solomon, a grande personagem do filme é Patsey, vivida pela estreante Lupita Nyong’o, que empresta o lombo para a impactante cena das chibatadas.


* O filme teve nove indicações ao Oscar, nas categorias de melhor filme, melhor diretor, melhor ator [Ejiofor], melhor atriz coadjuvante [Lupita], melhor ator coadjuvante [Michael Fassbender], melhor roteiro adaptado, figurino, montagem e design de produção.

O Mordomo da Casa Branca


* Outro filme que traz à superfície uma reflexão necessária sobre o racismo é O Mordomo da Casa Branca, inspirado na história real de Eugene Allen, um mordomo que trabalhou por 34 anos na Casa Branca e atravessou oito administrações, tornando-se patrimônio histórico da instituição.

* Como o filme não firma um compromisso com a verdade dos fatos, optou-se por adicionar efeitos dramáticos e transformar o personagem em Cecil Gaines, vivido pelo “oscarizado” Forrest Whitaker.

* A propósito, o filme não recebeu nenhuma indicação ao Oscar, mas o desfile de celebridades no elenco é o próprio tapete vermelho, desde grandes divas do cinema como Vanessa Redgrave e Jane Fonda passando por estandartes feito Robin Williams e John Cusack até chegar no black power contemporâneo, excedendo as cotas com Cuba Gooding Jr., Terrence Howard, Mariah Carey, Lenny Kravitz e até Oprah Winfrey, digna de muitos elogios.


* Vai para a mesma prateleira de Histórias Cruzadas, junto com os filmes indispensáveis sobre racismo e a luta pelos direitos civis dos negros na América.

Perguntas


* O artigo de J.R.Guzzo na Veja da semana passada foi implacável. Guzzo, que já foi o diretor de redação da revista, diz que o governo subestima a capacidade dos brasileiros de pensar com a própria cabeça – talvez porque muitos brasileiros realmente não o façam.

* Entre as perguntas que faz às autoridades federais, questiona a inércia do governo que assiste – sem tomar providência alguma – o estelionato praticado contra o trabalhador brasileiro com o dinheiro do Fundo de Garantia. Ao longo dos últimos quinze anos, cerca de 20% do dinheiro do fundo sumiu, mastigado por cálculos de reajuste sempre abaixo da inflação.

* O Brasil deve ter uma safra recorde de 90 milhões de toneladas de soja este ano. Um quinto da produção será jogado no lixo, porque os portos brasileiros não tem condição de escoar uma produção de tamanho volume. Por que Dilma, então, deu de presente a Cuba um porto de 1 bilhão de dólares enquanto nossa soja apodrece no pé?

* E a promessa da construção de 6 mil creches, que ao fim do prazo fixado bateu a marca de somente mil, e os mais de 880 aeroportos regionais que ela conseguiu a proeza de não entregar nenhum – um só que fosse. Dilma também prometeu ferrovias que não vai entregar e águas que não vai transpor, nem do São Francisco, nem de lugar nenhum.


* A resposta comum em todos esses casos é a falta de dinheiro. Mas vale lembrar que, mesmo com o dinheiro escasso, o governo paga 54 mil reais por mês de aluguel para dar um teto ao seu diplomata-mor em Nova York. Uma conta pequena, pra quem gastou 1,4 bilhão na construção do estádio Mané Garrincha, em Brasília. Mas quem não tem dinheiro precisa fazer muita conta.

Ela


* Ela do título é Scarlett Johansson. Mas não em carne em osso. Somente na voz e no imaginário, já que o espectador – de posse da informação que trata-se da voz da atriz – não pode deixar de imaginá-la ao ouvi-la.

* O filme Ela ambienta-se em um futuro próximo e fala de um tema que hoje soa maluco, mas que amanhã pode muito bem se cumprir: o relacionamento entre um homem e o sistema operacional do seu computador.

* O personagem de Joaquin Phoenix, durante seu processo de separação, encontra consolo nos “braços” de Samantha, que deu a si mesmo o nome, depois de ler, em milésimos de segundos, um livro com centenas de milhares de sugestões de nomes. Isso é possível porque Samantha é um sistema operacional de computador, fique claro.

* O diretor Spike Jonze, que já trazia na bagagem esquisitices de sucesso como Quero Ser John Malkovich, foi feliz na realização deste trabalho, onde consegue lançar um questionamento interessante sobre os sentimentos.

* Em uma das cenas, a ex-mulher [vivida por Rooney Mara] argumenta que a paixão por um sistema operacional não é real. Acontece que toda paixão é real. Todo arrepio, toda lágrima, toda dor de barriga é real. O motivo que despertou o sentimento pode não ser real, mas a emoção é sempre real.


* Concorre ao Oscar em cinco categorias: melhor filme, melhor canção original, melhor trilha sonora, melhor design de produção e melhor roteiro original, esta última com mais chance de levar a estatueta pra casa.

Jesse Owens


* Eu baixei um aplicativo no meu telefone chamado History Quiz. É um jogo onde aparecem quatro imagens fazendo referências a um personagem ilustre da História e você precisa adivinhar quem é.

* Passei semanas encalhado nas imagens de um corredor, pareciam fotos antigas, o sujeito era negro mas não tinha uma única pista sobre a nacionalidade dele, nem a época, nem nada.

* De repente, sentado no cinema com a menina que roubava livros na minha frente, a resposta cai no meu colo: Jesse Owens. O atleta e líder civil norte-americano ganhou quatro medalhas de ouro nas Olimpíadas de Berlim em 1936 e aparece como ídolo do personagem Rudy, que no filme é um grande corredor e pinta o rosto de preto pra ser tão rápido quanto Owens.


* Reza a lenda que Hitler teria se ausentado do estádio diante da vitória de um negro para não ter que cumprimentá-lo.

Dura


* Fabio Porchat recebeu ameaças anônimas de alguém que vestiu a carapuça – provavelmente um policial corrupto ou um par deles – por conta do vídeo Dura, publicado há duas semanas no Porta dos Fundos. Desde o especial de Natal que uma esquete do grupo não repercutia tanto: mais de 5,5 milhões de acessos até hoje.


* O pai do humorista, ex-deputado, pediu ajuda ao amigo senador Álvaro Dias [Paraná] para que aquela casa intervenha na investigação do caso. É aquela velha história: você manda o recado pra uma puta, o Bataclan inteiro se ofende.

Álbum de Família


* A história que eu conheci e que vou gostar de contar é que Julia Roberts foi a um dos teatros da Broadway assistir à peça August Osage County, um drama familiar do dramaturgo Tracy Letts, e enlouqueceu com o que viu. Na mesma hora, transformou aquilo num projeto pessoal e decidiu que viveria a personagem Barbara.

* Melhor que realizar um desejo é realizar dois desejos: Julia Roberts iria contracenar com sua atriz favorita, Meryl Streep, que aceitou o papel da matriarca Violet. O resultado, realização de um sonho, termina no tapete vermelho do Oscar, com Julia indicada ao prêmio de melhor atriz coadjuvante e Meryl ao de melhor atriz principal.


* A primeira já faturou o prêmio na categoria principal quando interpretou Erin Brockovich há uma dúzia de anos. A segunda é a rainha das indicações, candidata honorária jubilada da Academia. Ganhou apenas três vezes e ainda assim ninguém ganhou mais que ela, a última delas como Margaret Thatcher, a Dama de Ferro.

Clube de Compras Dallas


* Apesar da tradução do título ser quase literal – o original fala em compradores – eu não tinha a menor ideia do que se tratava o Clube de Compras Dallas, mas algo me remetia aos delírios de consumo de Becky Bloom. Só que não.

* O clube de compras em questão é um assunto muitíssimo mais delicado: o contrabando de drogas não aprovadas pela FDA [uma espécie de Anvisa americana?] quando o fantasma da Aids começou a assombrar os portadores do vírus HIV, nos anos oitenta.

* A história começa em Dallas, 1985, quando o personagem de Matthew McConauguey – um típico cowboy racista e homofóbico – descobre que está morrendo de Aids. O médico lhe dá a sentença: fazer com que todos os seus projetos caibam em trinta dias.

* Passada a fase da negação, ele começa uma batalha pela vida em busca de drogas que lhe ofereçam alguns dias a mais e associa-se com um travesti, personagem de Jared Leto [vocalista da banda 30 Seconds to Mars].

* Os dois estão impecáveis em suas atuações, com direito a emagrecer dezenas de quilos pra composição dos personagens, que lhes renderam sua primeira indicação ao Oscar, de ator principal e ator coadjuvante, respectivamente.

* Em um dos diálogos entre eles, o cowboy jura para o travesti que “Deus estava vestindo a boneca errada quando lhe abençoou com um par de bolas”. A propósito, o roteiro também é candidato à estatueta dourada, assim como a edição e a maquiagem. Também concorre na cobiçada categoria de Melhor Filme. Tudo isso com orçamento diminuto – pouco mais de 5 milhões de dólares.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A Menina que Roubava Livros



* Eu não havia lido o livro, o que costuma aumentar o entusiasmo na hora de ir ao cinema. Ler antes costuma resultar em uma expectativa que nunca se cumpre, como foi o caso d’O Caçador de Pipas, cujo livro tem hoje suas páginas regadas de lágrimas e um filme bem menos comovente.

* Assim, sem nem tomar conhecimento sobre o assunto, mergulhei de cabeça na história d’A Menina que Roubava Livros e quase me tornei o menino que roubava lenços. Aliás, quase todos os filmes sobre o nazismo têm esse poder de remexer nossas entranhas, pelo próprio horror que nos faz compadecer o sofrimento alheio.

* Quando se faz isso com poesia, então, é um convite às lágrimas. É como pegar o filme Meu Primeiro Amor [com o Macaulay Culkin, lembram?] que já é tristíssimo e adicionar os horrores da guerra, da perseguição, dos bombardeios e de ir ao encontro da morte.

* A atriz que interpreta Liesel, a menina que rouba os livros do título, é a canadense Sophie Nélisse e seu par, Rudy, é interpretado por Nico Liersch – ambos desconhecidos até então, crianças do século vinte e um, mas incríveis. Especialmente juntos. Espero poder voltar a escrever seus nomes muitas vezes. Pra engrossar o elenco, temos Geoffrey Rush e Emily Watson como o casal que adota a menina.

* A história é narrada pela morte, em primeira pessoa. Começa trazendo à superfície a certeza de que, cedo ou tarde, todos temos um encontro com ela. Todos deslizaremos por seus braços. Ao fim, ela devolve o medo com o qual a enxergamos dizendo que ela, a morte, se assombra conosco.

* Pra não dizer que o filme ficou completamente fora do Oscar, está concorrendo na categoria de melhor trilha sonora. No entanto, tem potencial pra muito mais que isso.

Capitão Phillips


* Se eu tivesse que responder qual foi a maior lacuna entre as indicações ao Oscar deste ano, diria rapidamente que foi Tom Hanks, por seu Capitão Phillips, que entregou-se de corpo e alma ao seu personagem e emociona no desfecho da trama.

* Porém, eu não saberia dizer quem deveria ficar fora pra ele entrar, já que esta categoria conta apenas com cinco poltronas do teatro Dolby [antigo Kodak], onde o prêmio será entregue na noite de 02 de março, em pleno domingo de carnaval.

* Capitão Phillips narra a epopeia de um navio cargueiro que viajava pelo Chifre da África quando sua embarcação foi sequestrada por piratas somalianos, fazendo seu comandante de refém. O fato foi narrado pelo próprio capitão Phillips no livro que deu origem ao filme. A propósito, uma das seis indicações que o filme recebeu ao Oscar foi na categoria de Melhor Roteiro Adaptado.

* As outras indicações foram nas categorias de edição, edição de som, mixagem de som, melhor filme e melhor ator coadjuvante para o impronunciável Barkhad Abdi, o ator somaliano que faz o papel de um dos piratas sequestradores.

* A direção é de Paul Greengrass, habilidoso em criar uma atmosfera de tensão como nos dois últimos filmes da trilogia Bourne, onde substituiu Doug Liman, e em seu Vôo United 93, que lhe rendeu uma indicação à estatueta dourada que ainda não consta na sua estante de conquistas.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Trapaça


* O cineasta nova-iorquino David O. Russell era um ilustre desconhecido do grande público há pouco tempo. Até que em 2010 ele filmou O Vencedor e de repente viu seu trabalho indicado a sete Oscar [levou melhor ator coadjuvante para Christian Bale e melhor atriz coadjuvante para Melissa Leo], uma façanha e tanto pra quem acaba de surgir na Academia.

* Só que ele foi mais longe. No ano passado, seu filme O Lado Bom da Vida foi o campeão de indicações à estatueta dourada. Foram oito, que na noite do Oscar acabaram em uma única vitória para Jennifer Lawrence, com direito a um histórico tropeço na escada do teatro.

* Emendando um projeto no outro, seu novo filme Trapaça rendeu mais um feito heroico: outra liderança na lista de indicados ao Oscar, empatado com Gravidade, do mexicano Alfonso Cuarón. Os dois filmes concorrem em dez categorias.

* Desde os anos noventa, quando comecei a acompanhar o Oscar, não lembro de um diretor que tenha tido esta proeza. Três filmes em quatro anos com um total de 25 indicações. A maioria delas nas categorias artísticas, o que deve significar que o cara é incrível dirigindo atores.

* Contudo, devo dizer que apenas gostei dos seus filmes. Não adorei nenhum deles e sigo achando que David O. Russell ainda está buscando sua identidade no cinema. Sua obra não tem assinatura, falta aquela impressão digital nos faça detectar a presença do diretor sem precisar ler seu nome.

* Trapaça é um filme sobre um par de picaretas que aceita trabalhar para um agente do FBI como uma espécie de troca, para não serem presos. O objetivo da missão é chegar no inacessível chefe da máfia, que é interpretado por Robert de Niro em uma participação afetiva, sem créditos.

* No afã de guardar uma boa surpresa para o final, o filme acaba confundindo um pouco o espectador, e é este o seu principal pecado. Os quase 150 minutos de projeção guardam algumas cenas memoráveis, mas também uma dose de tédio.


* No entanto, a trilha sonora fica acima de qualquer suspeita – linda! – o que sempre dá uma alternativa pra quem não estiver curtindo o filme: assistir de olhos fechados.

Números Rasos


* O Facebook completou 10 anos esta semana, contrariando todos aqueles que pregavam que a rede não passaria de uma febre. Por curiosidade, fui checar a data em que entrei na brincadeira. 08 de maio de 2008, provavelmente na época do êxodo do Orkut.

* Há 20 anos, Marisa Monte lançava seu álbum Cor-de-Rosa e Carvão, pra mim o melhor da cantora e talvez o melhor da minha vida inteira. Não sei se alguém um dia terá tanta inspiração para superá-lo. O disco inaugura sua parceria com Carlinhos Brown.


* Pra comemorar 30 anos de carreira, desde sua aparição franzina no Fantástico ao lado da madrinha Beth Carvalho, Zeca Pagodinho reuniu os bambas do samba no programa das noites de domingo cantando seu sucesso Camarão que Dorme a Onda Leva.

Stephen Ward


* O novo musical de Andrew Lloyd Weber tem enfeitiçado as plateias que lotam o teatro Aldwych, em Londres, todas as noites. Stephen Ward é uma leitura musical do escândalo que abalou as estruturas políticas inglesas no ano de 1963, no caso que ficou conhecido como Profumo Affair.

* As canções são envolventes e a peça é bem amarrada, com o princípio e o fim na mesma cena, na câmara dos horrores de um museu de cera, onde o protagonista Stephen Ward está lado a lado com a figura de Hitler.

* A ideia de começar e terminar numa sala de museu é boa, mas não é inédita. Achei muito parecido com o que acontece no musical Aida, de Elton John e Tim Rice. Aliás, Tim Rice já foi um dos grandes parceiros de Lloyd Weber e hoje é seu desafeto.


* No entanto, o ponto alto do musical acontece ainda no primeiro ato, com o coro completo cantando You’ve Never Had it so Good, numa coreografia espetacular simulando um grande bacanal que faz corar os mais ortodoxos, mas de um bom gosto tremendo. Quem estiver de passagem marcada pra Londres pode incluir na programação.

Ao Mestre com Carinho


* Bonito o coro do colégio cantando o tema do filme Ao Mestre com Carinho, na semana de estreia da novela Em Família. Eu, que nasci tarde, só conheço o filme pela sua boa reputação, mas confesso que nunca o assisti – exceto a cena da homenagem, que vi ontem no Youtube enquanto pesquisava minha relação com aquela melodia familiar.

* Descobri que Os Abelhudos, um grupo infantil dos anos 80 – da minha infância, portanto – gravou a música em português, assim como a apresentadora Eliana o fez alguns anos mais tarde para a trilha sonora da novela Carrossel.

* Mas nem um nem outro remexeu os escaninhos da minha memória. Só depois, na fase mais avançada da pesquisa, lembrei que a música estava no episódio final da primeira temporada de Glee, quando os alunos homenagearam Mr. Schue, To Sir with Love!

Gravidade


* Quando Gravidade entrou em cartaz, no ano passado, uma única razão levou-me ao cinema. Esta razão atende pela graça de Alfonso Cuarón, um diretor mexicano que venho acompanhando com entusiasmo desde Grandes Esperanças – que é o filme que eu cito quando alguém me pergunta qual o meu filme número um.

* Nem George Clooney, nem Sandra Bullock teriam me seduzido com um filme de astronauta. Não fosse por Cuarón, eu só teria me interessado pelo filme depois de conhecer a lista dos indicados ao Oscar deste ano, liderada por Gravidade – ao lado de Trapaça – com dez indicações para cada um deles.

* As principais indicações estão na categoria de melhor filme, melhor diretor e melhor atriz para Sandra Bullock – ela já guarda na estante um Oscar recente por seu desempenho no filme Um Sonho Possível. As outras indicações são dentro de categorias mais técnicas, como melhor edição ou, no caso de Gravidade, da falta dela, já que a primeira cena do filme deixou os críticos boquiabertos pela ausência de cortes num longo plano onde a câmera passeia pelo espaço sideral.

* Pra quem não assistiu, trata-se de uma história onde dois astronautas se empenham em sobreviver depois de um acidente que os deixa à deriva no espaço. O filme cria uma tensão que não te abandona nunca, mas sem o propósito de assustar – apenas porque a situação em si, estar preso/solto do espaço, é naturalmente tensa.

* Nesta missão de sobreviver e de renascer após uma adversidade [nessa mensagem o diretor é brilhante], Sandra Bullock dá um upgrade na sua carta de motorista. Até então, ela estava apta somente a dirigir ônibus, como em Velocidade Máxima, mas agora já pode encarar foguetes e naves espaciais.


* A cena em que ela consegue entrar na nave, livra-se da roupa de astronauta e flutua em posição fetal é a que guardei em minha memória. Talvez porque ali foi a única sensação de descanso que eu pude sentir nos noventa minutos de filme.

Amor à Vida


* O último capítulo de Amor à Vida não foi um sucesso de público, mas parece ter agradado aqueles que acompanharam a estreia de Walcyr Carrasco no horário nobre. Com 44 pontos no Ibope, não chegou nem a fazer sombra para o último capítulo de Avenida Brasil, por exemplo, que teve 52 pontos, ou mesmo à sua antecessora Salve Jorge, que bateu 48 pontos.

* No entanto, foi um final de reconciliações e fortes emoções. Paulinha, que foi uma chatinha a novela inteira, me emocionou duplamente, tanto na cena com Ninho quanto naquela com Félix. A própria Suzana Vieira, que é alvo comum de críticas na vida pessoal, mostrou-se mais uma vez uma atriz decisiva.

* Mas a coroação, é claro, foi de Mateus Solano, o grande astro que entrou como vilão e terminou redimido, com direito a protagonizar o polêmico primeiro beijo gay da história da dramaturgia na Rede Globo.


* A propósito, a emissora se pronunciou sobre o assunto: Toda cena de novela é consequência da história, responde a uma necessidade dramatúrgica e reflete o momento da sociedade. O beijo entre Felix e Niko selou uma relação que foi construída com muito carinho pelos dois personagens. Foi, portanto, o desdobramento dramatúrgico natural dessa trama. A pertinência desse desfecho foi construída com muita sensibilidade pelo autor, diretor e atores e assim foi percebida pelo público. É importante lembrar que o relacionamento homossexual sempre esteve presente nas nossas novelas e séries de maneira constante, responsável e natural. A cena esteve de acordo com essa premissa e com a relevância para a história.