* O que eu vejo de mais
interessante – e que me faz gostar ainda mais – na obra do Chico Buarque é a
quantidade de enigmas que se escondem nas entrelinhas das suas canções. A
riqueza da sua poesia é tão grande que levo anos para consumi-la.
* Digo isso porque acabo de
desvendar a fonte de inspiração onde Chico foi beber para compor a canção
Sonhos, Sonhos São – que faz parte do álbum As Cidades, lançado há quase quinze
anos. Veja bem: quinze anos foi o tempo que eu precisei pra me dar conta que o
título da música está no texto da peça A Vida É Sonho, do dramaturgo espanhol
Calderón de la Barca.
Iracema e América
* Esse disco, aliás, é um tesouro
que já esteve no balaio das Americanas por quaisquer dez reais – ainda há quem
atire pérolas aos porcos. Iracema Voou, por exemplo, foi lançada nesse disco e
eu me apaixonei pela música imediatamente, tanto que a incluí no repertório do
musical Quadrilha.
* Só depois da milésima vez que
cantei o verso “Iracema voou para a América” foi que percebi: Iracema é um
anagrama da palavra América. Pra quem não lembra o que são anagramas, vou
poupar o Google: embaralhe as letras e forme uma nova palavra.
Sonhos, Sonhos São
* A propósito da minha
descoberta, vale um parêntese: tudo parece muito óbvio depois que alguém entrega
a coisa mastigada, como a solução de uma equação de segundo grau. A graça, no
entanto, é ficar ruminando até ver a luz se acender com a resposta certa.
* No caso desta música a que me refiro – e é bem
provável que pouquíssimos a tenham ouvido, já que nunca foi tema de novela nem
tocou nas FMs, fica então restrita ao público que consome Chico na fonte – a
solução da charada praticamente caiu no meu colo enquanto eu assistia o filme
nacional Irma Vap [que também tirei do balaio das Americanas].
* Na primeira cena do filme, uma
cena de funeral, Marieta Severo faz uma participação afetiva recitando alguns
versos da peça A Vida É Sonho. “O que é a vida? Um frenesi.O que é a vida? Uma
ilusão, uma sombra, uma ficção. E o maior bem é pequeno, porque toda a vida é
um sonho. E sonhos, sonhos são”.
* Por ironia do destino, quem me
deu a resposta foi Marieta, que durante uma vida foi esposa do compositor e
inspirou a canção Beatriz, personagem da Divina Comédia, mas que lida em inglês
tem a mesma sonoridade de “be actress”, ser atriz – ofício que Marieta cumpre
como poucas neste país.
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